Maria Carol Medeiros

Autoestima é cuidar do corpo e da pele?

A pauta do dia é a legenda da foto de Sheila Mello. Que é um desserviço às mulheres etc etc. Claro que é. Eu não tenho nenhum interesse no que ela diz, razão pela qual não a sigo. Mas me interessa mais entender os motivos que levam a este comentário e que não são exclusividade dela.

A História mostra a beleza como ativo para um “bom casamento”. Beauvoir já debatia em 1949 como a beleza é virtude para a mulher, enquanto a feiúra é a desgraça à qual as feias são relegadas. Uma construção que acontece diante da necessidade da conquista do olhar do homem.

Entretanto, essa beleza, que até o século XX era algo inato, um dom, passa a ser um dever e um prazer: como mostra Denise Bernuzzi de Sant’Anna (2014), se embelezar com maquiagem e ornamentos era visto como algo moralmente suspeito, mas na segunda metade do séc XX se torna “uma prova de amor por si mesma e pela vida”. Para a autora, essa mudança complica as “maneiras de ver e examinar a própria imagem”.

Essa certa autonomia – “só é feia quem quer” – coloca na mulher a falaciosa liberdade de fazer o que quiser com o próprio corpo. “Meu corpo, minhas regras” te soa familiar? Acreditamos que só depende de nós – mas paradoxalmente isso implica em termos ainda menos escolha. Quanto mais opções de nos embelezarmos existirem, maior será a cobrança para o que virou “cuidado de si”.

A apropriação da “autoestima”, como Sheila Mello diz, como algo relacionado à beleza, ao peso e à pele, tem uma única finalidade: colocar na mulher a responsabilidade individual sobre manter-se bela. “Ah, mas eu faço as unhas porque eu gosto”. Não é porque você gosta. É porque você vive numa sociedade em que te foi ensinado a gostar. Mas a culpa não é sua. Nem de Sheila. Essa pressão é social e estamos todas nessa lógica.

Não é para deixar de fazer as unhas, se te apetece (mero exemplo dentre tantos outros que eu poderia dar). Mas é pra te lembrar que essa lógica é social, não individual, e que nunca terá fim. Sempre haverá algo que vc não fez e que será convencida de que precisa fazer. Basta se lembrar: não será assim que vc vai construir autoestima.

Referências:

BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo.
SANT’ANNA, Denise Bernuzzi de. História da beleza no Brasil.